quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Algumas definições de Montagem e Edição


No Brasil, “montagem” é um termo normalmente mais relacionado com o cinema e “edição,” com a televisão. Na prática eles muitas vezes são usados de forma indistinta, mas na teoria de cinema alguns autores estabelecem diferenças entre os dois conceitos.

“Cortar [cutting] ou editar [editing] um filme é ligar os planos fisicamente na ordem em que eles devem ser projetados” (Kawin, 1992: 49)

“Planos e cortes compõem praticamente todo o mundo visual do filme, tanto quanto as palavras e sua ordem compõem a frase, ou uma sequência de frases torna-se um livro. O termo genérico para o que foi organizado no âmbito do plano é mise-en-scène. O termo genérico acerca de como os planos estão ligados é montagem [montage] (Estes são dois dos mais importantes e problemáticos termos nos estudos de cinema ...) [...] o espectador interpreta a montagem para estabelecer o que esses pontos de vista distintos podem ter a ver um com o outro” (Kawin, 1992: 51).

“A edição [editing] é a arte de tomar decisões sobre o comprimento do plano, seleção e sequenciamento. Corte [Cutting] é o ato de emendar pedaços de filme. Decidir o quanto incluir de um plano em um filme, sugerir e manipular sua matriz interpretativa, cortando entre dois planos, é o trabalho do editor do filme” (Kawin, 1992: 436).

“Quando um filme é feito de mais de um plano, a edição entra em jogo. Quando um plano não se limita a seguir um outro e sua justaposição tem um significado dinâmico, não se trata de edição, mas de montagem. O termo francês para a edição de continuidade é découpage: ele denota uma sequência ordinária de cortes, onde um plano segue o outro de um modo linear e fácil de se acompanhar. “Montage” - do verbo francês "monter”, “subir, montar ou juntar" - indica a forma como é montado um plano ao lado de outro, mas não tem a conotação de uma ascensão ou de efeito intensificado. Montagem, então, é a arte de reunir planos separados em um sistema dinâmico” (Kawin, 1992: 98).

Kawin, Bruce. How Movies Work. Berkeley: University of California Press, 1992

“Como a edição é uma forma de comunicação, tem havido uma tendência perene na história da teoria do cinema em associar a edição com o paradigma da comunicação, linguagem [...] Para compreender a edição devemos entender isso como uma forma de comunicação, sem tentar reduzí-la a um modelo de escrita e leitura” (Carroll, 1996: 403).

Carroll, Noël. Theorizing the Moving Image. Cambridge University Press, 1996.

Edição pode ser pensada como a coordenação de um plano com o próximo. Como vimos, no filme, um plano é um ou mais fotogramas expostos em série, em uma extensão contínua de película. O editor de cinema elimina as imagens indesejadas, normalmente descartando todas, menos a melhor tomada. O editor também corta fotogramas supérfluos, tais como os que mostram a claquete, no começo e no final dos planos. Ela ou ele, em seguida, junta os planos desejados, o fim de um no começo do outro (Bordwell e Thompson, 1995: 271).

Bordwell, David e Thompson, Kristin . Film Art. New York: McGraw-Hill, 1995.

Como vimos em sala, Alfred Hitchcock tem sua opinião sobre tais termos, preferindo a palavra "assemblage", que não tem um equivalente em português. A entrevista do diretor pode ser assistida nesse link (a incorporação dele no blog foi desativada pelo YT): http://www.youtube.com/watch?v=2FoYrmNICYc .

Tanto a definição preferida e demonstrada por Hitchcock, como as expressas nos textos acima não devem ser tomadas como dadas, mas discutidas aqui e em sala, não para chegar a algo definitivo, mas para tentar compreender o processo como um todo, que prefiro ver como parte de toda a produção de cinema e não apenas da chamada pós-produção, aquela que ocorre após as filmagens (até porque a montagem pode muito bem começar durante as filmagens, na verdade antes delas, como vimos em sala).

Aguardo os comentários da turma.

21 comentários:

  1. Adorei a ideia de criar um blog que abranja temas que vemos em aula. Será um dos meios de consulta que usarei para lembrar termos e significados, já que, em aula, às vezes fica complicado anotar tudo que é dito (ainda mais que minha memória é uma beleza hehehe). Já neste primeiro post relembrei vários detalhes que foram ditos em aula :D - Jéssica Martins

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  2. Eu pensava - não sei exatamente o porquê - que edição e montagem fossem processos distintos. Tinha uma idéia de que a edição fosse um processo anterior à montagem,ou seja, editar seria o modo de organizar as cenas, planos, etc e como as possíveis formas de sequenciamento poderiam afetar de maneiras diferentes o andamento da narrativa. Aí, só após essa concepção intelectual, entraria a montagem,o processo físico de juntar as partes da maneira como foi pensada durante a edição.Com certeza hoje é claro pra mim que edição e montagem se confundem, mas sempre via distinção entre os processos. Acho que era uma visão mais antiga e ingênua que eu tinha do processo cinematográfico, e diria até obsoleta, visto que é justamente a ligação íntima entre todos os processos - vimos na sala de aula como é importante para um editor/montador conhecer a maneira e o estilo de trabalhar dos envolvidos na produção - que vai garantir o sucesso do trabalho.

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  3. Eu já nunca achei que houvesse diferença entre montagem e edição e pra mim isso tudo fazia parte de um mesmo processo de transformar cenas soltas em filme com tudo que este tem direito no fim de toda a produção.
    Agora com as aulas fico eu pensando que o montador/editor tem que ser bom de verdade para que o filme tenha um bom resultado final pois afinal de contas ele é o principal responsável por transformar as sequências em filme. Fico me perguntando porque então estes profissionais são tão menos famosos que atores e diretores.

    PS: Quem fala é Bruno Leonardo. Varnion é um pseudônimo.

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  4. Realmente é bastante tênue a linha de definição entre os dois termos, mas acho mais plausível a concepção de edição fundamentelmente como sendo a estruturação da linguagem através do sequenciamento de planos, ou seja, algo mais relacionado à narrativa em detrimento à parte estritamente técnica. Nesse caso, a montagem seria o processo complementar da edição, ligando as cenas já editadas de maneira mais funcional e técnica. E com certeza a relação de conhecimento e proximidade entre os envolvidos numa produção é fundamental para o desenvolvimento do trabalho do editor/montador, uma vez que a possibilidade de um diretor se expressar da maneira como pretende será confirmada ou contrariada na hora da edição e montagem.

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  5. A proposta do blog não é reproduzir o que foi dito em aula, mas ampliar as discussões e propor novas perspectivas para enriquecer o debate. Mas fico contente em saber que ele também está sendo útil para relembrar os temas discutidos na sala. Sobre as diferenças entre os conceitos de edição e montagem, há controvérsias exatamente pela falta de precisão que estes dois termos apresentam na teoria de cinema, mas a simples discussão desse tema deixa margem a muitas outras, como as expressas nos comentários de vocês, sem que haja a necessidade de fechar a questão.

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  6. Este comentário foi removido pelo autor.

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  7. Sobre o fato dos montadores serem menos conhecidos do que os diretores e atores, podemos atribuir essa situação à própria estrutura imposta pelo sistema de produção, que favorece a exposição de quem aparece diretamente no filme e de quem o "assina". Estes estão sempre rodeados de uma equipe de trabalho e são mais solicitados na fase de lançamento e divulgação de um filme. Montadores geralmente trabalham com muito menos pessoas, não estão acostumados a se expor e estão exaustos após terminarem o seu trabalho, impossibilitando de qualquer maneira que eles participem do processo de lançamento. Alguns montadores se transformaram em diretores, como o americano Robert Wise ou o brasileiro Eduardo Escorel, transitando estre estes dois regimes de trabalho.

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  8. O que acontece quando o filme é feito por um diretor altamente autoral?!? Ele que também faz a montagem ou fica o tempo inteiro ao lado do montador, ou o montador que faz tudo?!

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  9. Sobre as definições, poderia fazer alguns comentários. Em primeiro lugar, não consideram o som como componente da montagem. O livro de Bordwell e Thompson apresenta um capítulo sobre som, que trata de questões cruciais de montagem, mas deixa as questões técnicas espalhadas pelo livro. Carroll rejeita a expressão "linguagem cinematográfica" pelos motivos expressos no seu texto.

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  10. Rodrigo, isso depende muito de cada diretor e das circunstâncias do filme ou mesmo de que época da história do cinema estamos falando. Nos tempos do cinema silencioso, por exemplo, era comum que os diretores montassem os seus próprios filmes. Orson Welles foi um diretor que sofreu muito com os estúdios e seus tirânicos produtores, que fizeram montagens praticamente à sua revelia de "Soberba" (The Magnificent Ambersons), "A Dama de Shangai" (The Lady from Shangay) e "A Marca da Maldade" (Touch of Evil), cujo plano-sequência inicial exibi para a turma. Muitos diretores trabalham quase sempre com os mesmos montadores, como Joaquim Pedro de Andrade e Eduardo Escorel, Francis Coppola e Walter Murch, Martin Scorsese e Thelma Shoonmaker, o que os desobriga de acompanhar todo o processo pela confiança que depositam neles. Outros preferem participar mais da montagem.

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  11. É...antigamente eu imagino que a montagem era feita pelo próprio diretor mesmo, como foi Cidadão Kane. E os outros de Welles foram maltratados pelos estúdios, tal como Soberba... Mas eu estava pensando em algo como Tarantino, Coppola, Darren Arronofsy. Porque eu penso que muita coisa da genialidade dos filmes deles são graças a montagem, e se eles não tem participação, a genialidade não deveria ser creditada a eles. Tal como os diálogos de Tarantino que costumam sutilmente apresentar o personagem, mas muitas vezes não tem muito a ver com a história, e mesmo dessa forma, em momento algum você perde o interesse pelo filme. Ou então as montagens rápidas de Guy Ritchie, que tem como montador Jon Harris hoje em dia, mas que tem a fama de fazer um cinema "extremamente rápido".

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  12. Somente um reparo: o montador de Cidadão Kane foi Robert Wise, que depois se tornaria o diretor de "O dia em que a Terra parou", "Amor, Sublime Amor", entre outros filmes.

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  13. Acho que um outro motivo de os montadores não serem tão famosos é que no início a montagem era considerada um trabalho "artesanal" (em um sentido pejorativo, menor). Tanto que muitos montadores no início do cinema era mulheres, pois eles associavam a montagem à costura (como vimos num documentário que a Ana Lúcia mostrou). Sempre foi algo visto como uma trabalho menor. A parte boa é que isso criou pelo menos um nicho para as mulheres trabalharem na produção de filmes, não só como atrizes.

    A impressão que estes diferentes termos de edição me passaram também é que é uma questão meio semântica, porque existem diferentes palavras para descrever processos sutilmente diferentes. Mas no final, edição e montagem são feitos pela mesma pessoa, e basicamente ao mesmo tempo. Pelo menos é minha opinião.

    Aliás, fiquei com um dúvida: nos documentários que assistimos, é sempre mostrado o montador trabalhando sozinho, mas você falou sobre uma pequena equipe. Numa grande produção, qual o tamanho de uma equipe de edição? E há montadores que trabalham sozinhos, mesmo com grandes produções?

    Juliana

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  14. Bem, apesar de todos os comentários anteriores e do próprio texto que você postou sobre montagem e edição acho que o conceito ainda está meio confuso na minha cabeça.

    Há alguma sútil diferença que separa montagem de edição? Pq se os termos são na verdade a mesma coisa pq falamos em processo de "montagem e edição" e não somente "montagem" ou "edição".Pq se há a necessidade de falar em termos separados de montagem e edição e que estes se complemetam, então na verdade existe algo que os distingui, o que seria?

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  15. Juliana e Flávia, não pude ler os comentários no final do ano, mas vou tentar respondê-los agora.

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  16. Juliana, em grandes produções existe a figura do assistente de montagem, que faz o trabalho mais braçal, digamos assim, de organizar o caos da ilha de edição de um dia para o outro (caso não tenham que varar a noite editando), fazer cópias de um formato para o outro, entre outras tarefas. No caso da edição por computador, ele também tem tarefas como instalação de programas, back-ups etc. Mas cada produção é única e a as obrigações desse assistente também variam. Existe um livro na biblioteca da EBA que detalha esse processo, se chama "The film editing room handbook", ele trata em detalhes de toda a parte prática de montagem em uma grande produção, se valendo inclusive de um personagem principal, que é o assiste de montagem. Usei algumas das informações contidas nele em nosso curso, mas ele é realmente direcionado para grandes equipes.

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  17. Lembrando ainda que o Escorel trabalhou com outra montadora, que o ajudou no Santiago. E que muitas vezes o diretor faz questão de acompanhar a maior parte da montagem, principalmente se não está muito familiarizado com o estilo do montador.

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  18. Flávia, em uma conversa informal, os termos podem até ser usados indistintamente. Mas os linguistas dizem que não existem sinônimos estritos, especialmente quando escrevemos em um trabalho acadêmico ou temos que fazer uma apresentação oral. Nessas situações, muitas vezes é necessário que os termos-chave sejam definidos com mais precisão. Como Kawin ressaltou, são termos problemáticos, cuja etimologia estimula diversas interpretações. Por isso é preciso decidir e descrever com clareza sob qual acepção vamos usá-los, principalmente se a idéia que vamos desenvolver no texto ou apresentação envolver um conceito específico de montagem ou edição. Mas, de modo geral, ainda vale que, no Brasil, "montagem" é mais usado em relação ao cinema e o termo "edição" é mais do "campo semântico" da televisão. A convergência entre os modos de produção dos dois meios pode tornar a questão ainda mais complexa e o nome da nossa disciplina tentou dar conta desta complexidade. Para finalizar, o uso de cada um dos termos envolve ainda aspectos referentes ao estilo individual de escrita de cada pesquisador. Não sei se sanei sua dúvida, mas esse é um problema que envolve tradições diferentes de prática e estudo de cinema, por isso há mesmo uma certa imprecisão.

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  20. Este comentário foi removido pelo autor.

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  21. Olá Léo, muito bacana o texto. Parabéns!

    Estou trabalhando em uma monografia sobre edição dentro da narrativa seriada televisiva e apesar do foco acima sobre cinema, invariavelmente terei que falar do cinema ao explorar a montagem/edição.

    Uma dúvida: Não encontrei os livros citados, em tradução para o português... Essas traduções são livres? Você mesmo que as escreveu?

    Se possível, teria mais alguma bibliografia sobre o tema para me indicar? Principalmente sobre edição/montagem dentro da linguagem da televisão. Mt difícil de encontrar...

    Desde já obrigado! abçs

    thiagomoura87@gmail.com

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